Cartas de Gestão #33

Uma forma interessante de enxergar a gestão do caixa

13 de novembro de 2020
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UMA FORMA INTERESSANTE DE ENXERGAR A GESTÃO DO CAIXA
Podemos resumir o caixa da fazenda como aquele dinheiro disponível na conta bancária da fazenda.

E sendo assim, já podemos concluir que este é um fator de extrema relevância para um bom desenvolvimento do negócio e que o gestor deve sempre ficar atento ao caixa.

Isso me causa um pouco de espanto, pois muitos produtores ainda tocam seus negócios sem saber qual é a posição de caixa da fazenda.

E o fato é que, recentemente, estive conversando com um colega justamente sobre gestão de caixa e como, no momento atual, está havendo uma urgência para se livrar do caixa.

Explico.

Sem querer entrar em maiores complexidades, o caixa da fazenda é um capital. E como todo capital, ele deve estar rendendo. Ou seja, deve estar contribuindo para a rentabilidade do negócio. E uma boa gestão do caixa, baseada em princípios claros, deve ser aquela em que o caixa vai estar rendendo justamente o que rende a taxa Selic. E, atualmente, a Selic está em míseros 2% e ao que tudo indica, vai perder até da inflação, o que representaria um rendimento real negativo.

Daí a urgência para "se livrar do caixa". Um capital que não está rendendo nem acima da inflação? Vamos logo alocar esse capital em algo mais rentável!

Bom, o raciocínio parece certo. Na verdade, está certo mesmo. Mas, vamos devagar pois é preciso analisar alguns pontos.

Primeiro: muitos produtores não possuem uma gestão de caixa bem feita e o dinheiro acaba ficando parado em conta ou na poupança (a grande maioria dos produtores toca seu negócio na pessoa física). Ora, se o caixa está parado em conta ou na poupança, essa urgência não deveria existir, pois as duas situações são ainda piores do que quando o caixa está rendendo a Selic.

Segundo: o objetivo de possuir caixa não é conseguir rendimentos! O retorno do negócio não deve vim do caixa, mas sim das operações da fazenda! Há 3 objetivos para se possuir caixa: bancar o processo produtivo; aproveitar oportunidades de bons negócios; e cobrir eventuais imprevistos. Simples e claro. O rendimento que podemos conseguir com o caixa é um ADICIONAL e não deve ser visto como objetivo. Portanto, se as atuais condições de juros e inflação brasileira resultarem em um rendimento real negativo com o caixa, fazer o que? Faz parte do negócio.

Isso quer dizer que o caixa da fazenda deve estar alocado da mesma forma em qualquer cenário. Ou seja, rendendo a Selic.

Não é porque o rendimento está baixo que o gestor da fazenda deve procurar qualquer tipo de alternativa para alocar o caixa em alguma opção aparentemente mais rentável.

O caixa estar rendendo pouco não é motivo para investir em máquinas, em mais gado ou em novas construções. É claro que as atuais condições de juros podem favorecer tais negócios. Uma taxa de desconto menor, representa uma viabilidade maior. Mas isso não deve ser O motivo para alocar o caixa em outras opções.

Entretanto, tais fatores descritos acima são motivos sim para evitar - no momento atual - EXCESSO de caixa. Mas, como saber se há excesso de caixa? E aqui que vem uma grande sacada que eu e meu colega tivemos em nossa conversa.


Talvez seja interessante nós adotarmos uma espécie de "sistema de limites" para gerenciar o caixa.

O gestor da fazenda definiria um certo nível de "caixa ideal" e um nível de "caixa mínimo". Com estes dois níveis definidos, as decisões seriam tomadas da seguinte maneira: se o caixa está entre o mínimo e o ideal, toma-se decisão por alocar capital para o caixa; se o caixa estiver no nível ideal ou acima, toma-se decisão por alocar capital em outras opções.

Simples, claro e direto.
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Mas a questão que todos devem estar se fazendo é: como definir o nível ideal e o nível mínimo?

Minha sugestão é que você comece a definição por uma análise de múltiplos e depois passe para um valor monetário mesmo, já que acho que fica mais fácil acompanhar em termos de valores monetários.

Quanto aos múltiplos, na série Gestor Rural, nós liberamos um artigo sobre caixa não tem muito tempo e nele nós apresentamos 4 métricas para serem acompanhadas com relação ao caixa. E uma delas é o valor do caixa em relação ao valor da produção. De acordo com os dados levantados e pelo que pudemos estudar no artigo, valores entre 0,30 a 0,75x, poderiam ser considerados interessantes. Ou seja, se a produção vale 100 mil reais, algum valor entre 30 e 75 mil como "nível ideal" de caixa poderia ser considerado adequado. E lembre-se que o caixa não é uma medida estática, pelo contrário, ao longo do processo produtivo ele vai variando.

Após definir o nível ideal, partiríamos para o nível mínimo.

Matematicamente, o mínimo seria zero. Mas, no meu modo de ver, é loucura rodar a fazenda com caixa zerado. Portanto, este mínimo deve ser maior do que zero.

E nesse caso, acho que vai muito do gestor da fazenda e um pouco sobre sua tolerância à riscos (lembre-se dos objetivos para se ter caixa e que um deles é cobrir imprevistos). Portanto, caberia ao gestor definir um valor em que ele acredite que seria confortável como mínimo de dinheiro disponível.

Conhecendo estes limites, as decisões ficam um pouco mais facilitadas. Se o saldo de caixa estiver entre o mínimo e o ideal, não deveríamos priorizar decisões de investimento de capital. Já se o saldo de caixa estiver superior ao ideal, devemos priorizar decisões de investimento de capital de acordo com a realidade do momento.

Agora, quais decisões de investimento de capital tomar, já são outros 500 e precisam ser analisadas com cuidado e de maneira técnica, analisando a viabilidade econômica e como ela se encaixa com os objetivos estratégicos da fazenda.

Falamos um pouco sobre isso no nosso vídeo de respostas do 1º Desafio de Gestão. Se ainda não viu, fica aqui o convite para assistir. Ele estará no ar somente até a próxima terça (17/11).

Um grande abraço,

Autor
Gabriel H. Lima
Eng. agrônomo e fundador da Maja Consultoria

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