Cartas de Gestão Rural #67

Quando eu devo PARAR de investir na fazenda?

30 de julho de 2020
______
Uma das coisas que eu acho bastante interessante de ser feito é invertermos a perspectiva pela qual estamos olhando para alguma situação.

Na maioria esmagadora das vezes, estamos nos perguntando quando devemos investir na fazenda, onde devemos investir para que a fazenda dê mais lucros, quais os melhores investimentos que podemos fazer nela, etc...

Mas e se, no final das contas, o melhor a ser feito fosse NÃO investir na fazenda?

Em quais casos essa seria a melhor solução?

Para tentar responder isso eu consigo pensar em três tipos de cenários que vão indicar que podemos ou devemos parar de investir na fazenda.

Vamos trabalhar cada um deles.

#01 - Fazenda chegou na fase de maturidade do seu ciclo de vida

Eu sou insistente nesse ponto. É crucial que você entenda sobre os ciclos de vida das empresas (e das fazendas também, obviamente, pois fazendas são empresas).

E existem 4 fases no ciclo de vida das fazendas. A fase de Início, a fase de Crescimento, a fase de Maturidade e a fase de Declínio.

Dessas 4 fases, a fase que menos demanda investimentos é a fase de maturidade. Na prática, é nela que vamos colher a maior parte dos retornos pelos investimentos que foram feitos anteriormente.

É uma fase que a performance da fazenda está boa, os lucros estão estáveis, a geração de caixa está boa e, consequentemente, os retornos estão sendo colhidos.

Eu reforço que o ciclo de vida das fazendas não tem nenhuma relação com a idade da fazenda, ok? Podemos ter uma fazenda que já existe a 50 anos e ainda assim, não saiu da fase de início. Ou até virou uma fazenda zumbi.

E podemos ter fazendas com apenas 7 anos e que já estão na fase de maturidade.

O ciclo de vida está relacionado com a maturidade do negócio (do business) e consequentemente com a gestão dela.

Portanto, o primeiro cenário em que poderíamos parar de investir na fazenda, seria em um cenário da fazenda na fase de maturidade.

E aí quando a performance começasse a cair, entrando na fase de declínio, iríamos precisar retomar os investimentos para tentar reiniciar o ciclo, voltando para a fase de início.

#02 - Retorno sobre o investimento (ROI) baixo

Uma das principais confusões que existem sobre rentabilidade está relacionada ao ROI.

Tem muita gente que usa o ROI como medida de retorno da fazenda e também tem muita gente que calcula o ROI de forma errada.

ROI é Retorno sobre o Investimento (Return On Investiment). Portanto, para calcular esse indicador você precisa somente de duas informações: i) o montante financeiro que foi investido em um determinado período; ii) e o lucro líquido do mesmo período.

E o problema começa quando não ocorre uma correta diferenciação do que é investimento e do que é custo na fazenda. E aí as coisas já ficam bagunçadas, colocando o que é custo na conta, por exemplo.

Outro problema que acontece é o imediatismo. Ou seja, fazer um investimento hoje e já querer um bom retorno em três meses, por exemplo.

Vamos supor que você esteja inserido na pecuária de corte e vai trabalhar somente com a terminação e vai ser em confinamento. Daí você compra os animais já recriados e prepara a fazenda para iniciar os trabalhos.

Os animais, neste caso, não são investimentos. São despesas, pois é a reposição. Agora, os cochos para o trato dos animais, cercas, vagão e trator para o trato, aí sim seriam investimentos, pois eles vão gerar benefícios para a fazenda ao longo de vários anos.

Pois então, suponha que você vai usar todos esses investimentos ao longo de 5 anos. Isso significa que você só vai poder calcular o ROI concretizado no final dos 5 anos.

Mas isso não significa que você não deva calcular esse indicador todo ano. Você deve sim. Ao realizar um controle financeiro bem feito, conforme o que ensinamos no curso Gestão Profissional de Fazendas e trabalhamos nas nossas consultorias, você pode facilmente calcular o ROI ao final de cada ano.

Basta pegar o lucro líquido no ano e filtrar tudo que foi investimento no ano na nossa planilha de controle financeiro. Simples e fácil.

E aí você deve analisar o valor. Se ele não estiver condizente com as suas expectativas, talvez você deva reanalisar se deve continuar investindo na fazenda ou parar os investimentos.

Mas, o cenário mais claro em que você deve parar os investimentos na fazenda é o próximo.

#03 - Retorno sobre o Patrimônio Líquido (ROE) menor do que o custo de oportunidade

Como já é possível perceber, o ROE é diferente do ROI. Na maioria das vezes o ROI deve ser maior do que o ROE.

Em termos anuais, é até comum encontrarmos ROI com valores acima de 50%. Mas para o ROE, esse valor vai ficar, geralmente, entre 4 e 10%.

Considerando somente o lucro líquido das atividades produtivas e tudo isso na média, é claro. Vão ter anos muito melhores e anos muito piores.

Pois bem, e aí você precisa analisar o ROE, Retorno sobre o Patrimônio Líquido (Return On Equity) que é no final das contas o indicador mais importante para você, contra o seu custo de oportunidade.

Imagine que o seu custo de oportunidade seja o rendimento da poupança, que aliás, seria péssimo, diga-se de passagem. No texto da semana passada falamos sobre expectativas de retorno e um bom referencial para custo de oportunidade.

Mas vamos imaginar a poupança para facilitar.

Esse terceiro cenário deve ser analisado de acordo com um horizonte de tempo longo. Não faz muito sentido analisar o custo de oportunidade somente com um ano específico e já sair tomando decisões a torto e a direito.

Pegue pelo menos os últimos 5 anos. Quanto a poupança entregou de retorno nos últimos 5 anos?

Segundo uma pesquisa rápida no Google, nos últimos 5 anos o rendimento ficou em 5,23% por ano na média. Com uma queda expressiva. Em 2016, ela rendeu 8,30% e em 2020, apenas 2,11%.

Mas e a sua fazenda nos últimos 5 anos? Rendeu mais do que a poupança, que no nosso exemplo é o custo de oportunidade?

Essa é uma pergunta-chave para decidir se deve ou não continuar investindo na fazenda.

Se a sua fazenda está rendendo menos do que o seu custo de oportunidade, talvez seja o momento também para repensar os investimentos que está fazendo nela.

E o que me impressiona é que a esmagadora maioria dos produtores rurais ainda não calculam a rentabilidade das suas fazendas e não definiram ainda o seu custo de oportunidade. E isso são duas coisas extremamente importantes.

Enfim...

Esses seriam os 3 cenários em que eu acredito que poderiam ser indicativos de que os investimentos na fazenda deveriam ser interrompidos, postergados ou, no mínimo, reavaliados.

E para você teria algum outro cenário além desses? Me conta respondendo neste email ou mesmo me falando sua opinião sobre esse conteúdo.

Um grande abraço,
Gabriel H. Lima

Receba vídeos, textos, aulas e outros materiais sobre gestão de fazendas.