Cartas de Gestão Rural #75

Cortar custos nem sempre é bom. Entenda...

24 de setembro de 2021
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"Custo é igual unha. Tem que cortar sempre."

Essa é uma frase emblemática de um dos membros do trio de empresários brasileiros mais bem sucedidos da história. Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira.

Infelizmente não me lembro qual dos três é o autor da frase. Mas está relatada no livro Sonho Grande, no qual recomendo a leitura.

Mas vou arriscar cometer uma heresia aqui e tomar uma posição contrária a essa frase.

É claro que eu acho que devemos cortar custos, não me entenda mal.

Mas eu realmente acredito que cortes de custos sem muito fundamentos podem acabar levando a resultados piores.

Vou explicar mais um pouco para esclarecer a ideia.

Imagine uma fazenda qualquer, com seu plano de contas muito bem organizado e todos os centros de custos bem definidos.

Esses centros de custos são "consumidores de recursos financeiros" da fazenda, certo?

Até aqui tudo bem.

Mas eles também são os "promotores da produção".

Ou seja, eles consomem dinheiro da fazenda, mas contribuem (ou deveriam estar contribuindo) de alguma forma para a produção da fazenda e os resultados dela.

Vamos imaginar um cenário extremo: se você cortar todos os custos a zero, sua produção vai a zero também.

Esse é um cenário fictício, mas reforça bem a questão que estou levantando: o corte de custos pode impactar na produção também.

E aqui nesse momento eu preciso introduzir a produtividade na jogada.

Lembre-se sempre que produtividade é diferente de produção total. A primeira está diretamente ligada ao lucro, já a segunda não. Já explicamos isso diversas vezes e até temos uma aula gratuita no YouTube sobre o tema, por isso vou pular as explicações aqui.

Mas a verdade é que ao cortar custos, nós também podemos estar influenciando na produtividade. E conforme for essa influencia, os resultados finais (lucros) podem ser comprometidos.

Perceba que tudo que estamos falando aqui são meras condições. Ou seja, pode ser que sim ou pode ser que não.

Mas o que me preocupa é são dois tipos de corte de custos: o corte cego e o corte burro.

O corte cego acontece quando o produtor rural sai cortando custos sem analisar o custo de produção antes.

Isso acontece com muita frequência pois muitos ainda não possuem uma gestão de custos bem feita e aí sem dados e sem informações o trabalho fica muito mais difícil de ser feito.

E pior ainda é quando o produtor possui um monte de números sobre a fazenda, mas se tratam de números que não representam nada. Sem organização ou sem classificação correta. Nesse caso, é como se estivéssemos olhando para um mapa errado.

Para melhorar a gestão de custos e, consequentemente, ser mais efetivo na redução dos custos, precisamos fazer alguma análise prévia de como está a matriz de custo de produção da fazenda. Quais os centros de custos mais pesados? Quais os mais leves? Quais aqueles que estão fora do normal? E assim por diante.

Já o corte burro é aquela famosa economia burra que todos nós conhecemos e já fizemos alguma vez na vida.

E esse segundo tipo de corte de custos é o que eu acho que mais pode afetar na produtividade da fazenda. É querer economizar tanto e em tudo que no final das contas você acaba com um monte de fatores produtivos pouco eficientes, mais trabalho pra ser feito e resultados piores.

Aqui eu não quero dizer que o mais caro é sempre melhor ou o mais barato é sempre pior. Eu realmente não acredito nisso.

Mas até quanto vale a pena pagar mais barato por uma peça que seja reconhecidamente inferior? Isso pode representar uma ilusão de redução de custos de manutenção, mas as vezes está ficando é mais caro no acumulado, já que você poderia estar tendo que comprar mais vezes.

Ou até quanto vale a pena bater o núcleo da ração do gado na própria fazenda? Investimento no misturador, mais compras dos insumos, mais horas trabalhadas do funcionário responsável e tudo para, geralmente, acabar tendo um produto final inferior? Fora que uma mistura errada nos minerais pode resultar em complicações para o gado.

Ou seja, são diversas "economias" que vamos procurando e que no final das contas acabamos com um custo total menor (R$) e um custo de produção maior (R$/unidade) dada a influência negativa na produtividade. E esse é um cenário ruim.

O que podemos fazer então com tudo isso?

Bem, primeiro eu acho que devemos trabalhar o plano de contas da fazenda. Enviamos um vídeo terça passada sobre esse assunto.

Depois devemos estudar com cuidado os centros de custos da fazenda a procura de pistas sobre onde podemos cortar custos de maneira mais efetiva.

E depois devemos analisar questões como qualidade e preço e a influência na produtividade. Essa é uma análise mais subjetiva, mas muito importante de ser feita.

Concordo que custo é igual unha e precisamos cortar sempre. Mas precisamos ficar de olho onde termina a unha e onde começa o dedo...



Um grande abraço e ótimo final de semana,
Gabriel

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