Cartas de Gestão #15

Ciclos de vida e fazendas zumbis

10 de julho de 2020

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CICLOS DE VIDA E FAZENDAS ZUMBIS
Engana-se quem pensa que o nosso recurso mais escasso e importante é o dinheiro.

É claro que o capital é sempre uma variável escassa e importante para o desenvolvimento de todo negócio e também da vida humana. Mas o recurso mais escasso, e consequentemente mais valioso, que existe é o tempo.

Infelizmente (ou felizmente, não sei) nossas vidas são finitas. Temos todo tempo do mundo, como Renato Russo já cantou com todo seu brilhantismo. Até que deixamos de ter.

E, querendo ou não, existe um ciclo de vida nas empresas também.

Quando pensamos nas organizações, existem algumas diferenças no seu ciclo de vida em relação ao ciclo de vida humano.

A primeira diferença está relacionada ao tempo de vida. Podem existir diferenças consideráveis entre os diferentes setores e ramos de negócios. Fazendas, geralmente, possuem um ciclo de vida mais longo do que uma empresa de tecnologia, por exemplo.

Uma segunda diferença consiste em uma atividade "após a morte". Podemos ter empresas que já morreram, mas ainda continuam de pé, em funcionamento. No nosso ramo, eu as chamo de fazendas zumbis. E podemos ter casos de ressurreição também. Fazendas que já estão mortas e, por alguma mudança na gestão, elas voltam à vida.

Ao longo deste texto falaremos sobre as 4 fases do ciclo de vida das empresas, como você pode identificar em qual fase está a sua fazenda, como descobrir se a sua fazenda é uma fazenda zumbi e o que fazer para tentar ressucitá-la.



1ª Fase do ciclo de vida: INÍCIO

Esta é a fase inicial da fazenda. É quando a propriedade é adquirida e se iniciam as atividades.

Nela temos a organização das instalações e geralmente é acompanhada de investimentos iniciais em máquinas, instalações e animais, por exemplo.

Também temos nesta fase, a elaboração do planejamento estratégico com os objetivos de longo prazo e metas para o curto prazo visando este objetivo.

Este último ponto é uma fragilidade nas empresas rurais. Estes processos são feitos de forma muito informal. Na verdade, eles são feitos sem que o produtor saiba que está fazendo.

Engana-se quem pensa que o produtor não tenha um planejamento estratégico quando começa alguma atividade na fazenda. Ele tem, mas de forma muito mal estruturada e formalizada.

Geralmente, ele tem alguns planos em mente, alguns objetivos gerais e perspectivas para o futuro, afinal, ele está começando com a fazenda com algumas boas perspectivas sobre o seu negócio. Mas, tudo acaba sendo feito de forma informal, sem uma estruturação bem-feita e organizada.

Esta é a fase mais fácil de identificar. Basicamente, é quando a fazenda está começando. Não há muito segredo ou contas para se analisar.



2ª Fase do ciclo de vida: CRESCIMENTO

A segunda fase é marcada pelos bons resultados. As operações, geralmente, resultam em um resultado financeiro positivo e isso alimenta o apetite do empresário rural em procurar crescer ainda mais o seu negócio.

Ela pode ser acompanhada por novos investimentos para impulsionar o crescimento.

Eu considero esta fase como sendo crucial para a vida do negócio. É nela que muitos erros estratégicos são cometidos e que cobrarão seu preço no futuro, acrescido de juros.

É muito comum que os produtores confundam a maneira que este crescimento pode se dar. O crescimento é sempre bem-vindo. Se o negócio está gerando lucros, é completamente lógico que se procure crescer o negócio para que ele gere ainda mais lucros.

Mas o crescimento em produtividade deve ser sempre preferível ao crescimento da produção total. Acredito que já falamos sobre isso em outras oportunidades e provavelmente vamos falar mais e mais vezes no futuro, mas por agora não vamos nos estender neste ponto.

Em busca de crescer e desenvolver mais ainda o negócio, muitas vezes este crescimento se dá por aumento de área cultivada, aquisição de mais máquinas, mais animais, mais instalações, ou seja, o lado dos ativos no balanço patrimonial vai ficando cada vez maior e para rentabilizar todo esse ativo adicional será preciso um aumento de produtividade em maiores proporções.

Para identificar se a fazenda está nesta fase é preciso comparar alguns números ao longo dos anos. Comparando o ano atual com os três últimos anos por exemplo, procure identificar se está havendo aumento nos seguintes pontos: faturamento total, número de funcionários, total de gastos com mão de obra, custo total (geralmente quando falo de custo me refiro ao custo médio, o custo por unidade produzida, mas aqui estou me referindo ao custo total mesmo, ao total de despesas), lucros e o total pago em impostos.

Se estiver vendo variações positivas nas comparações anuais, é um indicativo de que a fazenda está na fase de crescimento.


3ª Fase do ciclo de vida: MATURIDADE

Esta fase pode ser considerada o "auge" da fazenda.

Isso não deve ser confundido com a fase em que a fazenda vai ter as maiores rentabilidades. É normal haver períodos de rentabilidades maiores na fase de crescimento.

Mas a característica mais marcante desta fase é que a fazenda consegue se sustentar sozinha, ou seja, não há necessidades claras de novos investimentos, os níveis de produtividade já estão próximos dos patamares mais elevados, existe uma certa segurança financeira para o negócio e a própria operação da fazenda consegue gerar recursos mais do que suficientes para os próximos ciclos produtivos.

Esta é a fase mais propícia para que os proprietários da fazenda façam uso da distribuição dos lucros, os dividendos do negócio.

Para identificar se a fazenda está nesta fase, pode-se comparar os mesmos fatores mencionados anteriormente contra anos anteriores e se notar que está existindo uma certa manutenção dos valores, ou seja, variações muito próximas à zero, é indicativo de que a fazenda esteja na fase de maturidade.



4ª Fase do ciclo de vida: DECLÍNIO

Na fase de declínio, a fazenda começa a ter uma estrutura ultrapassada e depreciada. A segurança financeira que existia na fase de maturidade, passa a ser uma insegurança financeira, podendo haver falta de capital de giro e recursos financeiros para sustentar as operações.

Alguns dos fatores que levam as fazendas a chegarem nesta fase são: a depreciação (estamos preparando um conteúdo à este respeito); quando os proprietários pesam demais a mão na distribuição dos lucros, ou seja, quando acabam pegando uma parcela maior do que a adequada dos lucros; e quando o fogo ou a paixão pelo negócio diminui.

Para identificar esta fase, você pode avaliar os mesmos fatores que falamos anteriormente, se estiver havendo uma diminuição neles, ou seja, uma variação negativa entre os anos, é possível que a fazenda esteja na fase de declínio.



E é aqui que chegamos nas fazendas zumbis. Fazendas zumbis são aquelas que estão de pé, em funcionamento, rodando operações, mas que não conseguem gerar fluxos de caixa em um nível que seja capaz criar riqueza para o proprietário.

Alguns pontos para se observar para identificar se estamos falando de uma fazenda zumbi são: i) estagnação no desenvolvimento, ou seja, as instalações, máquinas e infraestrutura geral da fazenda está ficando cada vez mais depreciada e não há uma renovação destes ativos; ii) os custos vêm crescendo mais do que o faturamento ao longo dos anos; e iii) a geração de fluxo de caixa da fazenda está sendo destinada a pagar contas ou financiamentos, este é um caso terrível em que o produtor se encontra na sinuca de "ter que produzir para não quebrar".

Como foi falado anteriormente, fazendas zumbis podem ser ressuscitadas. Para isso é preciso de haver uma alteração urgente na mentalidade do gestor principal da fazenda. Estas mudanças devem iniciar por uma avaliação do balanço patrimonial e eliminação de fatores que estão contribuindo negativamente para o negócio ou sendo um peso desnecessários, um fardo para os resultados. Geralmente, não tem segredo, será necessário muito trabalho e dedicação do gestor rural para ir melhorando a fazenda aos poucos e conseguir reiniciar o ciclo de vida da fazenda.

Um grande abraço e ótimo final de semana,

Autor
Gabriel H. Lima
Eng. agrônomo e fundador da Maja Consultoria

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