Cartas de Gestão #21

7 dicas para quem vai começar um negócio no agro

21 de agosto de 2020
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7 DICAS PARA QUEM VAI COMEÇAR UM NEGÓCIO NO AGRO
Não se engane pelo título do nosso texto desta semana. Mesmo que esteja escrito "para quem vai começar um negócio no agro", o conteúdo que vai ser trabalhado vale também para quem já possui algum negócio no agro.

Aliás, dependendo da situação, pode até servir mais para quem já possui algum negócio em fazenda e precisa de um reinício.

Eu separei 7 questões que acredito ser importante considerar quando vamos iniciar alguma atividade em fazendas.

É claro que não basta somente isso. Não são somente 7 coisas que precisamos considerar para iniciar um negócio. As coisas nunca são tão simples quanto gostaríamos.

E claro, o que veremos nas próximas linhas é uma abordagem geral. Ou seja, não é específica para alguma atividade do agro, mas tem seu valor por plantar uma semente na cabeça de quem se propõe a gerenciar fazendas.

Muitas vezes não é necessário mudar nada fazenda, mas sim na cabeça de quem faz a gestão.

Vamos aos pontos.

#1 - Seu negócio é sua vida. Quantos anos uma vida demora?

Não poderia começar de outra forma. Se você está pensando em iniciar alguma atividade com fazendas a primeira coisa que você deve fazer é ESQUECER o momento atual.

Se você estiver decidindo entrar em uma atividade pelo bom momento que ela vem passando ou pelo fato de ver outros produtores desta atividade tendo sucesso nos últimos anos, me desculpe, mas você está começando de uma maneira completamente errada.

Primeiro que temos ciclos de mercado e, provavelmente, o que você está vendo seja um ótimo momento do ciclo. E advinha? Uma hora esse ciclo vai virar pra baixo.

Segundo que uma narrativa de sucesso chama mais atenção. Mas te asseguro que da mesma forma que há produtores obtendo sucesso, há outros tantos passando dificuldade. Ambos na mesma atividade.

Mas o ponto principal nem é tanto este.

A questão crucial é que quando pensamos em fazendas, pensamos em negócios de gerações. Você deveria olhar para a atividade e se perguntar se vai gostar de estar produzindo nesta atividade daqui a 10 ou 20 anos. Se vai gostar de ver seus descendentes dando continuidade no negócio.

Aqui na PATRIA nossa cabeça é voltada totalmente para o longo prazo. Em todo trabalho que desenvolvemos procuramos pensar no mínimo em um horizonte de 3 anos. Menos do que isso não vemos sentido.

Procure escolher uma atividade que você goste e que te dê algum nível de prazer. Todas as atividades do agro são viáveis e interessantes. É claro que você precisa considerar questões climáticas por razões óbvias, mas o que vai determinar o sucesso (no longo prazo, é claro) não é a atividade em si, mas a competência na gestão.


#02 - Ponha um filtro nos seus ouvidos

Este segundo ponto está alinhado com o primeiro. Se você se apegar muito ao bafafá do momento vai acabar achando alguma atividade específica a melhor do mundo.

E não existe isso de melhor ou pior do mundo. Em nada na vida. Tudo há pontos favoráveis e pontos desfavoráveis.

Isso se tornou uma verdade ainda maior hoje em dia. Dependendo do grupo que você faça parte no WhatsApp, você vai receber uma enxurrada de opiniões com vieses, conflito de interesse ou mesmo opiniões de caráter pessoal que não vão te ajudar.

Procure informações de órgãos, instituições e pessoas imparciais. EMBRAPA, CONAB, MAPA, SENAR, SEBRAE e diversos outros possuem informações que podem ajudar.

E, claro, uma opinião técnica é importante. Mas seja criterioso e foque sua atenção nas características do NEGÓCIO, do business. Falaremos mais sobre isso na 6ª dica.


#3 - Estude e não pare de estudar

Você até pode começar em uma atividade que não sabe nada a respeito. Mas você não vai conseguir seguir nessa atividade se não estiver aprendendo a respeito.

Veja, há uma infinidade de alimentos que podemos produzir. E há outros tantos negócios que podemos desenvolver na fazenda não relacionado à produção de alimentos.

Ninguém vai conhecer todos. Mas todos podem estudar e aprender sobre.

E não deixe de estudar. Keep learning. Continue aprendendo. Sempre se lembrando da 2ª dica.


#4 - Erre muito e procure continuar errando

Pode parecer algo ilógico isso, mas o erro é fundamental para o desenvolvimento e o crescimento.

Falamos sobre estudar e aprender na dica anterior e nada ensina mais do que o erro.

Mas precisamo de salientar 2 pontos:

i) saiba identificar o erro o quanto antes e procure mudar a estratégia ou o que for para corrigi-lo o mais rápido possível. Errar é bom, mas demorar para identificar o erro é ruim e persistir no erro pode ser fatal.

ii) elabore uma estrutura de "registro de erros". No nosso curso de gestão ensinamos a elaborar um logbook de decisões com o intuito de criarmos uma espécie de banco de dados das decisões e o que levou a tomá-la ou recusá-la. É interessante criar isso para os erros também. Como identificou o erro? O que saiu fora do esperado? O que você acredita que foi a origem do erro? Qual a nova estratégia para tentar corrigi-lo? O que deve ser considerado em situações futuras semelhantes a atual? 


#5 - Construa um histórico de informações

Sabe o que é uma fazenda rica? Uma fazenda valiosa?

É aquela que possui uma base de dados extensa. Aquela que você consegue descobrir qual era a rentabilidade ou a margem EBITDA de 10 anos atrás e comparar com a atual.

E sabe como você consegue fazer isso? Começando. Se você quer ter um histórico de dados é preciso começar em algum momento. Hoje você desejaria ter começado a 10 anos atrás e daqui a 10 anos você vai desejar ter começado hoje.

Portanto, comece a construir o histórico de informações da fazenda. Registre todas as informações que julgar importante. Com o passar do tempo, com os estudos, erros e aprendizados no caminho você vai descobrindo quais são as mais importantes. 


#6 - Abra sua cabeça para além do meio rural

Esse é um ponto delicado e corro o risco de ser mal interpretado, mas vamos lá.

Estamos tratando de negócios aqui, ok?

Sendo assim, é importante você começar a entender de negócios de maneira ampla. Procure trabalhar na sua fazenda de forma empresarial, de modo que você consiga conversar de igual pra igual com outros empresários, mesmo que sejam de outros ramos.

Para isso é importante estudar as finanças de modo empresarial. Ter uma visão para lucros, retornos, margens e para gestão de riscos.

E isso é importante porque se pegarmos os dois extremos (uma pessoa que sabe muito de gestão empresarial e nada de fazendas e outra pessoa que sabe muito da atividade da fazenda mas nada de gestão empresarial) e tivermos que fazer uma aposta em qual conseguiria melhores resultados com a fazenda, em que você apostaria?

Eu colocaria minhas fichas na primeira.

Isso está em linha com o que falamos no texto da semana passada. 


#7 - Se una a pessoas/empresas que colocam seus interesses próprios junto aos da fazenda

Esse último ponto deveria ser algo óbvio, mas é possível encontrar muita relação comercial desbalanceada por aí.

E, novamente, vou correr o risco de ser mal interpretado. Mas é fundamental que os interesses estejam alinhados, entende?

Não dá pra sustentar nenhuma boa relação de longo prazo (olha o longo prazo aqui de novo!) que não seja com interesses alinhados.

Quando digo isso quero dizer o seguinte: ganhou? Ganha junto. Mas, perdeu? Perde junto também.

Isso só é possível se não houver nenhum tipo de conflito de interesse ou desequilíbrio na relação.

Vamos a alguns exemplos. Iniciando pelos ruins e terminando pelos bons.

Uma empresa que se propõe a vender insumos e ter "consultores" ou prestar algum tipo de consultoria para os produtores que são clientes.

Me desculpa, mas não dá para alguém ser vendedor e consultor ao mesmo tempo. O objetivo final do vendedor é vender, enquanto o objetivo final do consultor é deixar a fazenda melhor. Então de um lado quanto mais ele vender, melhor. E do outro quanto mais ele melhorar a fazenda, melhor também. Mas, qual empresa ficaria melhor se saísse comprando tudo a torto e a direito?

Além disso, um "consultor" assim, na hora de recomendar algum produto, a preferência dele vai ser por produtos de qual empresa?

Não dá para receber comissão por venda e prestar consultoria ao mesmo tempo. São interesses contraditórios.

E isso acontece muito com empresas de sementes, defensivos, ração e etc.

Cada um tem sua importância. Mas venda é venda. Consultoria é consultoria. Cada um tem interesses distintos para defender.

Outro exemplo ruim: empresas/pessoas que prestam serviço e transferem todo o risco para o lado do produtor.

Não tem que existir um equilíbrio pelo risco comercial? E em última instância, o risco não deveria ser até maior para quem está ofertando o serviço?

Isso é um caso, por exemplo, de empresas que prestam serviço de FIV (Fertilização In Vitro) e que, inclusive, será tema do próximo estudo de caso da série Gestor Rural, a ser liberado na semana que vem.

Muitas empresas assim vendem o serviço dizendo que "cobram por prenhez". Ok, isso parece ótimo para o produtor. Mas até a confirmação dessa prenhez existe um longo caminho e nesse meio tempo a conta a pagar do produtor vai só engordando.

Em linhas gerais, o que acontece é que no processo de implantação dos embriões e todos os demais trabalhos, incluindo os diagnósticos de prenhez, vão haver cobranças nisso. Então se acontecer de demorar para pegar a prenhez, o produtor acaba com uma conta bem alta também.

Ora, se a empresa se propõe a prestar o serviço ela não deveria assumir parcela do risco da transação, também? Se iniciar o processo de FIV e no final os resultados forem bem abaixo do esperado, a conta fica toda com o produtor como se ele fosse o único e exclusivo "culpado" por isso?

Quando o produtor ganha, a empresa ganha junto. Mas quando o produtor perde, a empresa vai perder junto também? Isso é estar alinhado. Qualquer coisa diferente disso é conversa fiada.

E para finalizar, trago um exemplo bom e que me ajudou a formar a noção de ética e alinhamento de interesses que tenho hoje.

Ainda na faculdade, o veterinário que atendia a fazenda da família (hoje ele não atende mais, pois se mudou para o Paraná, mas é uma excelente pessoa e um exemplo de ética) recebeu uma oferta para ganhar uma comissão na venda de algum produto que não me lembro qual era.

Pelo que me lembro a comissão era de 10% no valor da venda.

Se fosse um "vendedor/consultor", teria empurrado a venda e ganho a comissão. Mas ele não era vendedor e sim consultor. Então ele passou a proposta para nós e disse que conseguiria 10% de desconto no produto que seria a comissão dele.

Ou seja, ele transferiu a comissão que poderia ganhar como desconto para nós e deixou a decisão por nossa conta.

Enfim, procure se relacionar com pessoas/empresas que tenham interesses alinhados ao seu ou da sua fazenda. Ganhou, ganha junto. Perdeu, perde junto.

Levo isso como um princípio aqui na PATRIA.

Por exemplo, nos nossos produtos digitais, todos possuem 20 dias de garantia para conhecer o conteúdo. Se gostar e achar que vai poder aprender alguma coisa, ótimo, você ganha o aprendizado e nós ganhamos um parceiro comercial. Caso contrário, você solicita o cancelamento, seu dinheiro investido é 100% reembolsado e nós perdemos o faturamento da venda. No final das contas ou se torna uma relação em que você ganha e nós ganhamos ou uma em que você não ganha nem perde e nós perdemos.

Não conheço outra forma mais justa e mais honesta para fazer negócios.

Essas foram as 7 dicas que eu pensei para quem estiver pensando em começar uma atividade no agro ou mesmo repensar sua atividade.

Um forte abraço!

Autor
Gabriel H. Lima
Eng. agrônomo e fundador da Maja Consultoria

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